Nas eleições para deputado federal, deputado estadual ou distrital e vereador, os eleitos não são necessariamente aqueles que tiveram mais votos. Essa situação pode gerar confusão entre os eleitores em relação ao destino de seu voto na urna.
O que acontece com o meu voto? Eu posso acabar elegendo outro candidato, outro partido? Tecnicamente, sim, em casos que podem ser considerados exceções à regra.
Para explicar essa situação específica, no entanto, é preciso entender alguns conceitos do processo eleitoral brasileiro, como o sistema proporcional de votação, o voto em legenda e o quociente eleitoral.
A CNN ouviu Ricardo Vita Porto, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, para ajudar a tirar essa dúvida do eleitor.
Enquanto o presidente da República, governadores, senadores e prefeitos são escolhidos pelo sistema majoritário, no qual o vencedor é aquele que obtiver mais votos, o sistema proporcional, válido para deputados e vereadores, não considera apenas os votos nominais.
Esse sistema prioriza, em um primeiro momento, os votos dados aos partidos ou federações partidárias. Apenas em uma segunda etapa é levada em consideração a votação de cada candidato dentro de seu partido ou federação.
Vale ressaltar que o eleitor tem a opção de votar nominalmente em um candidato ou votar na legenda, escolhendo o número do partido e atribuindo sua escolha apenas a essa sigla.
Essas características do sistema proporcional oferecem uma opção ao eleitor: caso seu voto não consiga eleger o candidato escolhido, ele ainda pode contribuir na eleição de algum candidato do mesmo partido político ou federação partidária da qual a legenda faz parte.
Mas, desde as eleições de 2018, algumas situações muito específicas permitem que o voto de legenda “migre” para outro partido ou federação partidária. Segundo Ricardo Vita Porto, casos desse tipo são raros e configuram uma “exceção à regra”.
Antes de conhecer os novos deputados federais e estaduais – e também os vereadores, nas eleições municipais -, os votos de cada partido, ou federação partidária, são somados e comparados para descobrir quantas cadeiras aquela sigla ou federação conquistou.
Depois, são contabilizados os candidatos mais votados de cada legenda ou federação – que, consequentemente, preenchem as vagas conquistadas.
Mas o cálculo que define os parlamentares tem uma complexidade extra, que é estabelecida pelo quociente eleitoral e o quociente partidário.
Resumidamente o quociente eleitoral soma o número de votos válidos – votos de legenda e nominais de todos os partidos e candidatos, excluindo-se os brancos e os nulos – e divide o resultado pelo número de cadeiras em disputa. Vale lembrar que o número de cadeiras para deputados federais, estaduais e distritais, além dos vereadores, varia em cada estado ou município.
A princípio, apenas partidos ou federações partidárias que atingem o quociente eleitoral têm direito a alguma vaga. No entanto, desde as eleições de 2018, existe a possibilidade de essas legendas participarem da distribuição dos “votos de sobra” – que é, justamente, o motivo para que os votos dados na legenda possam “migrar” para outro.
Sim. Há uma possibilidade de o eleitor que votar na legenda acabe beneficiando outro partido ou federação partidária. Isso porque, segundo uma regra implementada pela Justiça Eleitoral em 2016, o partido que conquistou um ou mais assentos só pode ocupá-lo se o candidato classificado tiver obtido pelo menos 10% do quociente eleitoral.
Portanto, se a maior parte dos votos for na legenda, os candidatos mais bem colocados podem não atingir a “nota de corte”, e o partido acabar perdendo suas vagas. Nesse caso, o TSE refaz os cálculos para determinar as vagas que sobraram, que poderão ser distribuídas para outros partidos cujos candidatos tenham atingido o quociente eleitoral.
No entanto, conforme explica Ricardo Vita Porto, isso acontece em situações muito específicas. “Isso é exceção à regra. O voto de legenda, na imensa maioria das vezes, contribui para o partido ganhar uma cadeira”, esclarece o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB. Na maior parte dos casos, ele explica, os votos não vão para outra sigla.
Segundo Vita Porto, essa regra que determina que o candidato tenha obtido 10% do quociente eleitoral prejudica o efeito dos candidatos conhecidos como “puxadores de voto”. “Ela evita que um candidato com votação inexpressiva conquiste uma vaga”, explica.
A partir das eleições de 2022, essa regra foi aprimorada: agora, quando a vaga estiver vindo de uma distribuição de sobras, o candidato deve obter pelo menos 20% do quociente eleitoral para conquistar a cadeira.
Apesar do possível efeito de “migração” do voto para outro partido, Ricardo Vita Porto considera o sistema proporcional como positivo, porque ele “aproveita a vontade do eleitor”.
“Mesmo que o voto não contribua para eleger individualmente um candidato, ele pelo menos será aproveitado para contribuir na eleição de outro político daquele partido – que, em tese, deveria representar as mesmas ideias, as mesmas plataformas e os mesmos projetos. Se não fosse assim, o voto do eleitor poderia ser totalmente desperdiçado”, diz o especialista.
Ele também ressalta que a opção do voto na legenda é uma alternativa para que o eleitor ajude o partido, ou federação partidária, a conquistar mais vagas. “Ou seja: ele contribui para que o partido ganhe mais uma vaga, mas quem vai ocupá-las são os candidatos nos quais os outros eleitores votaram nominalmente”, complementa.
A CNN realizará o primeiro debate presidencial de 2022. O confronto entre os candidatos será transmitido ao vivo em 6 de agosto, pela TV e por nossas plataformas digitais.
Fonte: CNN